Legitimidade de convocação de AM extraordinária para moção de confiança ao Vice Presidente da Câmara Municipal

Parecer Jurídico

Consulente:

Assembleia Municipal de 

 

Palavras-Chave:

a) Legitimidade;

b) Moção de confiança;

c) Vice-Presidente da Câmara Municipal.

 

Questões:

A Assembleia Municipal consulente solicita a emissão de parecer quanto à legitimidade da convocação de uma Assembleia Municipal extraordinária para votação de uma moção de confiança ao Vice-Presidente do Município, em virtude de o mesmo ter sido alvo de um “ataque político” no âmbito das suas funções enquanto Vice-Presidente, ainda que em representação do Senhor Presidente da Câmara Municipal na Assembleia Ordinária de 30.04.2025.

Discussão:

Os órgãos representativos do Município são a Câmara Municipal e a Assembleia Municipal, que, enquanto órgão deliberativo, vê as suas competências, regime e funcionamento definidos, com alguma amplitude, na Lei, designadamente no Anexo I da Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, na sua redação atual (breviter, RJAL) – cfr. os seus artigos 24.º e ss.

Nesta senda, vem o Estatuto dos Eleitos Locais ¹ (doravante, designado apenas EEL), definir como “eleitos locais” os membros dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios e das freguesias, nos termos do disposto no n.º 2 do seu artigo 1.º.

Isto posto, cabe apreciar a factualidade apresentada; está em apreço, fundamentalmente, a legitimidade da convocação de assembleia municipal extraordinária para consequente votação de uma moção de confiança ao Senhor Vice-Presidente do Município.

A Lei das Autarquias Locais ² prevê, na alínea l) do n.º 1 do seu artigo 53.º, a possibilidade de a Assembleia Municipal votar moções de censura, em avaliação da ação desenvolvida pela câmara municipal ou por qualquer dos seus membros, nada se referindo quanto a moções de confiança.

Por outro lado, o Regimento da AM Consulente ³ refere que constituem “(…) direitos dos Membros da Assembleia Municipal, a exercer singular ou conjuntamente nos termos do presente Regimento (…)”, “[a]presentar projetos de deliberação, nomeadamente sob a forma de recomendações, de resoluções, de moções e de votos de louvor, congratulação, saudação, protesto ou pesar” (cfr. al. c. do n.º 2 do seu artigo 14.º).

No vácuo da legislação e, considerando que o Senhor Vice-Presidente se encontrava na Assembleia Municipal ordinária, em representação do Senhor Presidente da Câmara Municipal, cuja presença nessa assembleia lhe compete por via da alínea r) do n.º 1 do artigo 35.º do RJAL e, nessa mesma assembleia, foi alvo de um alegado ataque político por parte de um Deputado da Assembleia Municipal, por referência à atuação daquele nas comemorações do 25 de Abril – ora, na sua veste de Vice-Presidente e não em representação do Presidente da Câmara – não se encontra qualquer objeção formal à convocação de uma assembleia extraordinária para apresentar uma moção de confiança deste teor, ainda que tal não esteja assente no nosso ordenamento jurídico; veja-se, ademais, que a moção de confiança não será um instrumento vinculativo, representando, antes, uma forma de expressar publicamente o apoio político de que o executivo municipal, ou, in casu, um Vereador, mais concretamente o Vice-Presidente da Câmara, goza da parte da Assembleia Municipal.

Não obstante, não é despiciendo referir que, tendo sido a realização de assembleia extraordinária e subsequente votação de moção de confiança solicitada por parte do membro do executivo afetado ao Presidente da Assembleia – i.e., não surgindo espontaneamente da parte do órgão deliberativo, tal só deverá ter lugar se o Senhor Presidente assim o entender. Veja-se, nesse conspecto, que aquele direito, previsto no n.º 2 do artigo 14.º do Regimento da AM Consulente cabe, exclusivamente, aos membros dessa AM.

De todo o modo, para uma decisão mais justa e transparente, sempre se recomendaria que o Senhor Presidente da Assembleia Municipal apresentasse esta proposta ao Plenário, no sentido de averiguar se algum dos restantes membros da Assembleia Municipal pretende exercer aquele direito ou, por outro lado, que se dirija, informalmente, ao líder da bancada partidária pela qual o Senhor Vice-Presidente foi eleito.

Por que não despiciendo, é mister referir que o direito constitucionalmente consagrado à liberdade de expressão e, concretamente, à opinião política e partidária constitui um dos pilares fundamentais de qualquer Estado de direito democrático, conquanto não ofenda a esfera pessoal.

Não se pode, pois, olvidar que o exercício deste direito é essencial para a vitalidade democrática, sobretudo quando está em causa o confronto de ideias e a crítica política — instrumentos legítimos e necessários à fiscalização do poder e à promoção da transparência.

Conclusões:

– Não se encontra qualquer objeção formal à convocação de uma assembleia extraordinária para apresentar uma moção de confiança a um membro do executivo, ainda que tal não decorra expressamente da Lei, uma vez que a moção de confiança não será um instrumento vinculativo, representando, antes, uma forma de expressar publicamente o apoio político de que o executivo municipal ou um dos seus membros goza da parte da Assembleia Municipal;

– Considerando que o direito a apresentar moções, decorrente do Regimento da AM Consulente, é um direito atribuído aos seus membros e, considerando que a solicitação para a convocação de uma assembleia extraordinária dessa AM provém de um terceiro que nela não se integra, não se pode sufragar outro entendimento que não o de que, em ultima ratio, é ao Presidente da AM que compete essa decisão;

– Contudo, sempre se recomendará, em estrito respeito pela transparência por que se devem reger as suas funções, que o Senhor Presidente da Assembleia Municipal apresente esta proposta ao Plenário, no sentido de averiguar se algum dos restantes membros da Assembleia Municipal pretende exercer aquele direito ou, por outro lado, que se dirija, informalmente, ao líder da bancada partidária pela qual o Senhor Vice-Presidente foi eleito.

09 de maio de 2025.

Filomena Girão
(Advogada, cédula profissional 49004C)

Filipa Pereira Silva
(Advogada, cédula profissional 70291C)

¹ Lei n.º 29/87, de 30 de julho, na sua redação atual
² Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, na sua redação atual.